Curiosidades sobre a cerveja belga, por Daniel Wolff do Mestre-Cervejeiro.com

Saiba mais sobre a escola cervejeira considerada Patrimônio Imaterial da Humanidade

O Brussels Beer Challenge é um dos mais prestigiados concursos cervejeiros do mundo (Foto: Bart Van der Perre/Divulgação)

Atualizada, 11/1/2023, 14:35

Em 2016, a cultura da cerveja belga foi declarada pela Unesco Patrimônio Imaterial da Humanidade. Segundo o Relatório Anual de Cervejarias Belgas de 2015, a Bélgica contava com aproximadamente 200 cervejarias, número expressivo se levado em conta o tamanho do território do país europeu, pouco maior do que o estado de Alagoas (em torno de 30.528 km²). Um paraíso para o apreciador de cerveja, a escola cervejeira belga criou receitas cultuadas como a da DeuS, que nos últimos anos foi incorporada ao portfólio da InBev (leia mais aqui). Daniel Wolff, sommelier de cervejas e diretor da rede Mestre-Cervejeiro.com, condecorado na cerimônia de abertura do Brussels Beer Challenge 2016 membro honorário da Cavalaria da Pá de Brassagem, tradicional grupo da Confederação das Cervejarias Belgas, preparou as dicas sobre essa escola cervejeira, que a Beer Art compartilha a seguir.

Porta de entrada

“As cervejas belgas, complexas e de perfil frutado, são apreciadas mundialmente, e algumas delas chegam a ser consideradas as melhores do mundo. Muitas vezes elas são uma porta de entrada ao universo das artesanais – principalmente para quem gosta de vinho.”

História

A tradição cervejeira belga tem uma longa história. Desde antes da conquista pelo Império Romano, há mais de 2 mil anos, já se produzia cerveja nos Países Baixos. Com a queda de Roma, o poder da Igreja cresceu e começaram a surgir alguns monastérios, que já vinham equipados com cervejarias para suprir a demanda dos próprios monges e, também, da população local.

“Com o tempo, os monastérios foram refinando suas técnicas e aprimorando as cervejas, que se desenvolveram com um perfil complexo, intensamente aromático, alcoólico e com uma complexidade transcendental de aromas e gostos. Ao mesmo tempo em que os monges ampliavam seus conhecimentos, as cidades cresciam, o que incentivou o surgimento de cervejarias que produziam em escala industrial. Algumas seguiam o padrão de produção das cervejas de abadia, enquanto outras mantiveram as técnicas de fermentação espontânea em tanques abertos, produzindo as chamadas cervejas Lambics. Assim, aos poucos, foi se desenhando o que atualmente chamamos de Escola Cervejeira Belga.”

Maior carta

Hoje, o bar com a maior carta de cervejas do mundo fica na capital belga, Bruxelas, contando com uma carta de mais de 3 mil rótulos.

“E, imagine, todas as cervejas belgas neste bar são servidas com a taça proprietária da cervejaria. Essa é a importância que os belgas dão à sua cerveja, e por isso a cultura da cerveja do país foi eleita como Patrimônio Cultural da Humanidade.”

Os estilos

Entre os principais estilos que compõem a rica paleta de cores, aromas e sabores da Escola Belga, estão (em cada um há sugestões de rótulos disponíveis na rede Mestre-cervejeiro):

Witbier - Cerveja de coloração amarelo-palha, normalmente turva, com boa formação de espuma densa e cremosa, com aromas cítricos e condimentados devido à adição de raspas de laranja e sementes de coentro. Na boca, baixo dulçor e leve acidez. É uma cerveja refrescante, ótima para dias de calor. Rótulos para conhecer: Hoegaarden, Celis White, St. Bernardus Wit.

Trapistas - Apresentam perfil aromático frutado, alto teor alcoólico, alta carbonatação e paladar seco. Entre os estilos trapistas estão a Belgian Blonde, com aromas remetendo a frutas amarelas, como pêssego e damasco; Belgian Dubbel, com aromas remetendo a chocolate e frutas secas como figos e ameixa; a Belgian Tripel, que também traz aromas remetendo a frutas amarelas porém com maior potência alcoólica e maior presença de lúpulos florais; e a Belgian Dark Strong Ale, versão mais potente das trapistas, com alto teor alcoólico e aromas complexos remetendo a tosta, frutas passas e licor. Rótulos para conhecer: La Trappe Blond, Chimay Rouge, Westmalle Tripel, Rochefort 10, Orval.

Saison - Em geral, são cervejas cuja cor vai do dourado ao âmbar, com grande formação de espuma e apresentando aromas complexos com notas cítricas, condimentadas e terrosas. Seu baixo corpo e alta carbonatação torna as Saison cervejas muito refrescantes, porém o teor alcoólico pode variar bastante – as receitas antigas tinham por volta de 3,5%, para poder ser consumida durante um dia de trabalho nos campos, porém hoje existem versões com mais de 8%. Recentemente houve uma febre de Saisons por todo o mundo e, no Brasil, este estilo tornou-se muito apreciado pelas cervejarias brasileiras por sua versatilidade permitir a inclusão de frutas regionais, com resultados bastante interessantes. Alguns rótulos para conhecer: Fantôme Saison, Tupiniquim Saison de Caju, Invicta / 2Cabeças Saison à Trois.

Lambics - A família Lambic engloba diferentes estilos produzidos através de fermentação espontânea. Ou seja, as cervejas Lambic são fermentadas por meio da ação de leveduras presentes no ar em vez de serem inoculadas com variedades selecionadas, como é prática comum nas Ales e Lagers. Por conta disso sua produção é delicada e feita tradicionalmente entre os dias 29 de setembro (Dia de São Miguel) e 23 de abril (Dia de São Jorge), quando as temperaturas estão mais amenas na Bélgica, assim evitando contaminações. O resultado são cervejas efervescentes, de caráter ácido e geralmente trazendo notas aromáticas rústicas que remetem a couro e feno. Por vezes contam com adição de frutas como cerejas (Kriek), são blends de Lambic nova com Lambic envelhecida (Gueuze), ou então tem adição de açúcar (Faro). Independente da variação, todas representam a tradição cervejeira da Bélgica e merecem fazer parte do repertório de quem curte cerveja. Rótulos para conhecer: Lindemans Kriek, Boon Mariage Parfait.

Flanders Red Ale e Oud Bruin - As Flanders Red Ale e Oud Bruin são cervejas tradicionais da região de Flandres. Em sua produção, parte delas passa por extenso envelhecimento – chegando por vezes a 18 meses – em grandes dornas de carvalho, o que contribui com um caráter acético à bebida, lembrando vinagre balsâmico, devido a ação de bactérias. Esta cerveja envelhecida é então misturada com uma parcela de cerveja “nova”, o que equilibra os aromas e gostos do conjunto. Alguns rótulos para conhecer: Rodenbach Classic, Duchesse de Bourgogne, Bacchus Vlaams Oud Bruin.

Além dos estilos descritos acima, a tradição cervejeira belga conta com outros estilos como: Belgian Pale Ale, Strong Golden Ale, Bière Brut.