As mulheres vieram para o mercado cervejeiro para somar
/Amanda Reitenbach escreve sobre o fortalecimento das mulheres no mercado cervejeiro e a importância de incluir os homens nesse movimento
Por Amanda Reitenbach, CEO e professora do Science of Beer
Eu estive recentemente na Colômbia para participar da Copa Tayrona como jurada e palestrante, e falei no evento sobre o fortalecimento das mulheres no mercado cervejeiro. Aproveito este texto para contar um pouco de como foi essa experiência, e também para discutir a necessidade de ampliar a discussão sobre a diversidade no mundo da cerveja.
Quando fui convidada para palestrar no evento, logo imaginei que o tema seria gestão sensorial ou outro assunto semelhante. Mas o convite dos organizadores era outro. Minhas entrevistas e outros materiais sobre as mulheres no mercado cervejeiro tiveram uma boa repercussão também por lá e eles queriam que eu falasse mais sobre esse assunto.
Elaborei então a palestra “A força das mulheres no mercado cervejeiro" e falei sobre o papel histórico das mulheres no surgimento e desenvolvimento da cerveja pelo mundo e a perda dessa posição ao longo dos séculos. Além da necessidade de retomar o protagonismo feminino e lutar para que as mulheres tenham o direito de fazer, de trabalhar e de se colocar no mercado de cerveja.
Meu público era majoritariamente masculino - as únicas mulheres no júri da Copa Tayrona eram eu e uma jurada da Colômbia, e entre as pessoas da platéia também haviam poucas mulheres. Mas isso foi ao mesmo tempo um desafio e uma oportunidade de apresentar o tema para um público mais amplo e trazer os homens para a discussão.
Pelas perguntas (foram muitas!) e pelo interesse da plateia ficou claro para mim que muitos homens querem contribuir para o fortalecimento das mulheres no mercado cervejeiro, mas não sabem como. Alguns conceitos básicos relacionados ao movimento feminista, ao caráter estrutural do patriarcado e do machismo ainda não estão claros. E os homens têm vergonha de perguntar sobre isso pois não se sentem incluídos na discussão.
As mulheres são, obviamente, protagonistas dentro da luta por maior presença feminina no mercado cervejeiro, mas esses movimentos não podem continuar sendo fechados. Ainda há falta de diálogo e inclusão dos homens na conversa. E isso não é bom, pois faz com que o feminismo cervejeiro continue sendo tratado como um tabu e com que as pessoas ainda tenham medo de escutar, de falar e de debater.
Como os homens poder auxiliar os movimentos feministas cervejeiros?
O machismo diário e as estruturas de uma sociedade patriarcal afetam diretamente o trabalho e as posições de mulheres no mercado cervejeiros. E os homens podem (e devem) contribuir para mudar esse cenário.
Uma das principais contribuições dos homens está em melhorar sua conduta no dia a dia. Ouvir o que ouvir o que as mulheres têm a dizer, sem fazer pré julgamentos ou menosprezar seus problemas ou opiniões; orientar outros homens para que revejam suas atitudes são alguns exemplos de mudanças comportamentais. Vale lembrar sempre que por conta dos inúmeros casos de machismo na sociedade, muitas das atitudes dos homens às vezes são vistas de forma natural, sem necessariamente uma maldade, mas que precisam ser repensadas para que sejam extinguidas.
Além disso, os homens podem contribuir oferecendo mais oportunidades profissionais para as mulheres no mercado cervejeiro - tanto nas áreas de produção, quanto em posições de chefia dentro das empresas. Convidar mais profissionais mulheres para participar e falar em eventos, concursos, festivais e conferências também contribui para aumentar a visibilidade e inspirar outras mulheres a trabalhar com cerveja.
A democratização da cerveja também precisa incluir outras minorias
Durante a minha palestra no evento, eu não falei apenas sobre as mulheres, mas também sobre outras minorias. Isso porque quando falamos do patriarcado e seus malefícios estamos tratando de um panorama cultural e social baseado na supremacia do homem branco e hétero.
Nesse contexto, a democratização do movimento cervejeiro passa pela inclusão de outras minorias. Onde estão os negros na cerveja? Onde estão os indígenas? Onde está o público LGBTQ+ na cerveja?Esse público ainda não se sente pertencente ao universo da cerveja.
Por isso, também falei de como as propagandas, os movimentos e os festivais cervejeiros como um todo ainda não se incluem muito essas minorias e como a gente precisa discutir a questão da diversidade para democratização da cerveja. Porque muito se fala que a cerveja é a bebida democrática, que é a bebida pra todos...Mas a gente a gente ainda não vê essa democratização no consumo, nas oportunidades e tudo mais.
Representatividade e inspiração
A visibilidade de mulheres a frente de negócios cervejeiros sempre faz muita diferença. Se hoje vemos várias profissionais comandando negócios relacionados a cerveja no Brasil é porque tivemos pioneiras no país. Trabalhos como meu, da Kátia Jorge, da Cilene Saorin e da Kathia Zanatta despertaram a vontade de muitas outras mulheres a fazer parte do universo da cerveja.
Depois da palestra, muitas mulheres me agradeceram por eu estar a frente de muitas coisas, por estar ali, por falar e representar coisas que elas vivem - e isso traz força pra muitas mulheres. Situações parecidas acontecem frequentemente no Science of Beer, pois muitas mulheres me procuram e chegam aos cursos por veem meu trabalho como inspiração.
Por conta disso, temos buscado mostrar mais claramente esse lado do Science of Beer em ser uma empresa feminina e que apoia mulheres. Tanto divulgando e mostrando o trabalho de outras mulheres, quanto buscando conhecer novas histórias.
Vamos construir um movimento cervejeiro mais inclusivo?!
Acredito que minha palestra foi super importante - e decidi compartilhar um pouco dessa experiência aqui - pois mostrou que os homens também estão abertos para escutar e debater a questão do fortalecimento das mulheres no mercado cervejeiro.
Eu também me senti super encorajada a falar mais sobre esse tema. Porque, durante essa palestra, percebi que nós temos a necessidade de um maior diálogo aberto a todos. Não há como mudar sem dialogar, sem informar e sem mostrar o que está errado e pode ser melhorado. Isso é o que falta dentro da sociedade como um todo: as pessoas entenderem primeiramente o que são essas temas e como isso está estruturado dentro da nossa sociedade, para que então tomem atitudes. Dessa forma, poderemos falar muito mais de diversidade e debater o assunto com mais tranquilidade, e assim garantir que o mercado cervejeiro seja mais diverso e inclusivo.
Quer saber mais sobre esse assunto? Confira o texto: Conheça histórias de mulheres à frente de negócios cervejeiros no Brasil E leia a minha entrevista para a revista BeerArt: Mercado cervejeiro tem de evoluir em diversidade