O “grand finale” do Festival Brasileiro da Cerveja

O quarto dia do Festival, sob a análise do jornalista e sommelier Luís Celso Jr.

Luís Celso Jr.

Especial para a Beer Art

Blumenau - Sexta e sábado são os dias de maior movimento no Festival Brasileiro da Cerveja. O público também muda de perfil: se na quarta e na quinta-feira era composto em grande parte por cervejeiros mais especializados, agora é de maioria leiga − sem aqui nenhum julgamento de valor. E o pessoal pode até ter menos conhecimento sobre a bebida, mas não vem com menos sede. São dias de muita movimentação e filas. E isso faz parte da festa.

E que festa! Mesmo nos últimos momentos, não repeti nenhuma cerveja e continuei firme no propósito de experimentar as novidades, que pareciam não ter fim. Confira mais algumas notas do “grand finale” do Festival Brasileiro da Cerveja.

Importadas

Mesmo sendo um evento com foco na produção nacional de cervejas artesanais, algumas importadoras estiveram presentes com seus rótulos. A BeerManiacs trouxe até uma novidade, a Brooklyn 1/2, uma Session Saison bem leve e saborosa, condimentada e frutada, de final seco e refrescante. Nada mais adequado no sábado, 14, dia mais quente do evento.

As importadoras Meara e Bier & Wein também estiveram presentes, e houve muito chope de marcas consagradas internacionalmente, como Baladin NazionAle e Tripel Karmeliet - ambos deliciosos e frescos. Destaco ainda o lançamento recente Kasteel Winter, uma Belgian Dark Strong Ale com notas de malte torrados marcantes, lembrando uma belo café cremoso, muito bem equilibrada. Uma delícia.

Parcerias internacionais

Duas colaborativas da Cevada Pura com a Cigar City (Foto: Divulgação

As cervejas colaborativas com cervejeiros e cervejarias gringas também são uma tendência dos últimos anos que não para de aumentar. A Colorado Marguerite, Saison feita em parceria com o cervejeiro Alexis Briol, da belga St. Feuillien, e a nova série Las Mafiosas, da Backer, com rótulos em parceria com a mestre-cervejeira Alex Nowell, da microcervejaria norte-americana Three Weavers Brewing, são ótimos exemplos já citados aqui na cobertura da Revista BeerArt. No entanto, das que eu provei no evento, o que me chamou mais atenção foi a parceria da cervejaria Cevada Pura, de Piracicaba, no interior de São Paulo, com a norte-americana Cigar City. Duas ótimas cervejas saíram daí: uma American IPA de amargor intenso, cítrico e limpo e, a minha preferida, Brown Ale com café e cacau. Nessa última, o café se destaca, lembrando grãos inteiros com torrefação média (nada de queimado) e leve cacau. Em perfeito equilíbrio com isso, está lá a Brown Ale, com seus maltes que remetem a caramelo e toffee característicos. Muito saborosa.

A malucas da vez

Muitas foram as cervejas exóticas e ousadas do Festival Brasileiro da Cerveja. Se você acompanhou nossa cobertura nos três primeiros dias, com certeza viu algumas coisas muito diferentes.

No último dia, consegui ainda provar a Jester Medusa, chamada de Lambic pela própria cervejaria catarinense. Independentemente da questão de origem - em teoria, só poderia ser chamada de Lambic a cerveja de fermentação espontânea feita na região do Vale do Rio Sene na Bélgica −, é uma ótima cerveja. Com perfil claro de brettanomyces, acidez elevada e ascética, notas selvagens, de couro estábulo, a Medusa tem um ano de barril é uma bela cerveja.

Outra coisa bem bacana e foi provar o hidromel − fermentado feito de mel − da Morada Cia. Etílica, o Xocolatl. Classificado como Metheglin Asteca pela cervejaria, leva nibs de cacau, canela e pimenta defumada. No aroma, as especiarias são até discretas, predominando o mel leve e floral. Já na boca, o cacau explode em sabor, trazendo chocolate intenso, com gosto doce e final levemente defumado e de canela. Impressionante!

Paraná

Aproveitei também os últimos momentos para fazer um incursão mais prolongada entre as cervejarias do Paraná. Além das já comentadas Petroleum em diferentes madeiras, da DUM Cervejaria, e de várias cervejas da Morada Cia Etílica que já mencionei, pude provar coisas interessantes. Uma delas é a Crazy Rye, cerveja de centeio e sem glúten, fruto de uma parceria entre Lake Side Beer e F#%*ing Beer. Ela foi premiada com medalha de ouro no Concurso Brasileiro da Cerveja em 2014 e agora está sendo lançada em garrafa.

Uma cerveja muito gostosa, com malte e lúpulos bem equilibrados e gosto levemente adocicado. A F#%*ing Beer é de Curitiba, mas a Lake Side Beer é de Passo Fundo (RS) e é a primeira cervejaria artesanal do Brasil a fabricar cervejas sem glúten.

Hoppy Day, American IPA da Tormenta (Foto: Divulgação)

Outro destaque é para a Cervejaria Tormenta. Provei a nova cerveja, a Wit Bear, e achei bastante agradável. Trata-se de uma Witbier bastante clássica e bem feita, com notas cítricas e condimentas, como manda a regra. Decidi experimentar também novamente a Hoppy Day, American IPA da marca, e achei diferente das versões anteriores. Está ainda mais agradável e equilibrada, com amargor limpo, cítrico e refrescante.

O lançamento da Ogre Beer, Django Cigano, também agradou. Uma Belgian IPA frutada e lupulada bem saborosa. Por fim, destaco a Bier Hoff Cocada Preta, uma Porter com coco queimado e cacau premiada com medalha de ouro na categoria Specialty Beer no concurso deste ano. Muito bem elaborada, equilibra os sabores dos elementos com uma bela cerveja base.

São Paulo

Rabo de Arraia, da Burgman, o nome que faz referência a um tradicional golpe de capoeira (Foto: Divulgação)

Não poderia deixar de destacar algumas das cervejarias de São Paulo com suas ótimas produções. A Júpiter trouxe ao festival aquela que vai ser sua mais nova produção, a Hop Saison. Uma cerveja refrescante, seca e com leve caráter ácido pela inclusão de brettanomyces. Ela está em fase final de elaboração.

Já a Urbana chegou com toda a sua irreverência no evento lançando a Fio Terra, uma IPA com laranja. Leve e refrescante, marcadamente cítrica, traz bom amargor e um “toque diferente” de laranja, como anuncia a cervejaria.

Outra cerveja legal é a Belgian IPA Rabo de Arraia da cervejaria Burgman, de Sorocoba. O condimentado do fermento belga aparece com bastante expressão se unindo a um frutado intenso e notas cítricas do lúpulo japonês Sorachi Ace. Na boca, amargor médio alto de caráter limpo e aftertaste persistente.

Madeira! [2]

Assim como escrevi ontem, andei à caça de cervejas maturadas ou envelhecidas em madeira. A Tupiniquim, eleita Melhor Cervejaria de 2015, lançou no evento toda uma série de envelhecidas em madeira. Minha escolhida foi a Saison de Caju Au Vin, usando a cerveja base de linha da marca gaúcha, feita em parceria com a Stillwater Artisanal, maturada em barril de vinho licoroso. O resultado é sutil, mas com um leve toque de madeira e mais adocicada do que a versão regular.

Na Bodebrown, fiz questão de provar a nova Atomga Cherry Wood Aged, aquela mesma Imperial Stout já lançada, só que agora maturada em barris de carvalho e adicionada de cerejas frescas. A novidade me lembrou um bolo “floresta negra”, com chocolate e cereja bem destacados, acompanhado por baunilha e amadeirado.

A Bamberg também trouxe madeira. Trata-se de uma Weizenbock Helles que passou 5 anos em barril de carvalho que maturou vinho tinto. A cerveja ficou mais escura, puxando para o marrom, em razão do tempo em contato com a madeira. Mas as frutas passas do estilo base foram ressaltadas, lembrando banana passa, além de baunilha, madeira e uma boa dose de condimentação. Na boca, o sabor é meio doce e meio ácido, remetendo ao vinificado ao final do gole. Uma delícia!

Por fim, a novata Liffey, um brewpub de Palhoça (SC), trouxe algumas opções de madeira interessantes. Experimentei a Doppelbock defumada, maturada em barril de Jack Daniel’s. A cerveja ficou interessante, com defumado marcado e toques de baunilha e coco queimado.

Luís Celso Jr., jornalista e sommelier, é editor do site bardocelso.com