A Lei da Pureza da cerveja, a Reinheitsgebot, e suas polêmicas

Daniel Wolff, fundador da Mestre-cervejeiro.com, explica a lei influente há 500 anos

Daniel Wolff chama a atenção para as disputas políticas e econômicas por trás da legislação bávara de 1516 (Foto: Divulgação)

Uma das primeiras lições sobre cerveja é a Lei da Pureza alemã, conhecida como Reinheitsgebot. Embora bastante citada, guarda algumas curiosidades e polêmicas, que o sommelier Daniel Wolff, fundador da rede Mestre-Cervejeiro.com e que recentemente criou um curso online inovador, menciona a seguir. A primeira delas é sobre o próprio nome, Reinheitsgebot, que se pode traduzir como "exigência de pureza". Sabia que foi dado apenas no século 20? Ou, ainda, que quando promulgada em 23 de abril de 1516, pelo então Duque da Baviera Guilherme IV, a regra valia apenas para a Baviera - e portanto não se aplicavam a cervejas alemãs produzidas em outras regiões?

Quando criada, a norma permitia apenas a utilização de água, cevada e lúpulo na fabricação da cerveja bávara. No século 20, além de ganhar um nome, a regulamentação foi atualizada para incluir a levedura - descoberta como protagonista da fermentação apenas no século 19, com Louis Pasteur. E, ainda, permitiu-se a utilização de outros cereais além da cevada, como por exemplo o trigo, ingrediente base das tão apreciadas Weissbier.

Daniel Wolff comenta:

“Outras modificações sofridas pela lei no século passado - por ser considerada protecionista pela União Europeia, e para adaptação ao mercado moderno -, foram: a liberação do uso de açúcar na fabricação, como é comum nos estilos belgas de cerveja, assim como a limitação do uso de nutrientes para as leveduras, a adição de gás carbônico (sem ser apenas através da fermentação) e do tratamento dos insumos, como por exemplo a reutilização de leveduras.”

Alguns dados históricos, porém, mostram que um dos motivos por trás da criação da Reinheitsgebot talvez não tenha sido apenas a preocupação com a qualidade da cerveja, mas também uma manobra econômica.

”Permitindo apenas cevada na fabricação, o duque Guilherme IV, da casa Wittelsbach - dinastia que governou a Bavária entre 1323 e 1918 -, dava um golpe na família do Palácio Eggenberg, que detinha o monopólio da produção das cervejas de trigo. Além disso, a maior parte do texto explicativo da lei é sobre controle de preços”, comenta Daniel.

Há indícios também de escassez de trigo na região na época, e o cereal deveria ser economizado para utilização na fabricação de pães. Além disso, as cervejas eram produzidas com "gruit" - mistura de ervas utilizada para temperar e conservar a cerveja, cujo direito de distribuição e concessão de permissão de uso era da Igreja Católica. Instituir o lúpulo como insumo que deveria ser utilizado para esse fim também foi uma das supostas razões para a criação da lei, como forma de controlar a produção das cervejarias e diminuir o poder econômico da Igreja.